Uma voz se ergue no silêncio. Rouca, forte e convicta, introduz um tema, uma ideia, um sentimento. Segue-lhe outra, que a apoia, mais aguda, quase que o prenúncio da corrente humana que lhes seguirá. Surge então o coro, unido, possante, de dicção extremamente marcada, transmitindo a força da união, mostrando quem é o povo alentejano.

Estas palavras tentam descrever um pouco o Cante Alentejano. De entre toda a música tradicional portuguesa, o Cante tem características únicas, singulares, fruto de uma região e de um povo igualmente únicos. Quase barricado entre o Tejo, Guadiana e a Serra algarvia, não esquecendo o Atlântico, o Alentejo foi moldando um povo forte, trabalhador e unido, que suporta dificuldades pelo isolamento e aridez de suas terras.

As modas alentejanas, músicas características do Cante Alentejano, e que podem também receber os nomes de refrão ou coro, são normalmente músicas de trabalho, versando temas que são muito próximos às pessoas do campo. As cantigas amorosas, assim como as cantigas religiosas, existem em todo o Alentejo, sendo que as cantigas relativas ao trabalho e às profissões são bastante diferentes de uma povoação para a outra. A dispersão dos povoados no Alentejo levou a uma “especialização” dos habitantes em certos tipos característicos de profissões e actividades, sendo esse facto bem presente nas modas que cada povo canta. É frequente ouvirmos modas dedicadas às ceifeiras, mineiros, pescadores, vindimadores, cardadores, etc. Outro tema muito querido ao Cante é o bairrismo, como se demonstra pela grande quantidade de modas dedicadas a diversas povoações de todo o Alentejo.

O Cante é uma pintura viva, realista e extremamente colorida do Alentejo.

Um dos grupos do Orfeão Universitário do Porto dedica-se a uma forma de expressão muito particular do povo alentejano: o Cante. O grupo de Cante Alentejano do OUP foi formado no início da década de 80 e tem vindo a representar e difundir a cultura dessa enorme região de Portugal, um pedaço da sua cultura tão amado e defendido pelos alentejanos e que se distingue de qualquer outra forma cultural do país. O grupo é formado unicamente por homens e apresenta-se em palco com outro símbolo do povo alentejano: o lenço Tabaqueiro. A união dos elementos em palco é também uma característica do Cante Alentejano, sendo sobressaída quando acompanhada do tradicional balançar.

Apesar de parecer estranho a existência de um grupo de Cante tão a norte do Alentejo, numa região em que a presença de alentejanos não é significativa, o grupo de Cante Alentejano do OUP mantém-se activo e com vitalidade, fruto do espírito característico da juventude mas também de toda a força e empenho que as modas alentejanas transmitem e a nossa admiração relativamente ao povo alentejano, com quem fizemos amizades distantes mas fortes, vincadas por um respeito mútuo.

Hugo Alexandre Silva